Protocolos e indicações da citorredução cirúrgica e quimioterapia intraperitonial hipertérmica – HIPEC.
A principal norma a ser utilizada para a realização da cirurgia citorredutora com quimioterapia intraperitonial hipertérmica é a seleção criteriosa dos pacientes que se beneficiarão do método. Só serão candidatos os pacientes em condições clínicas e nutricionais satisfatórias, selecionados após criteriosa avaliação cardiológica sem doenças associadas que poderiam oferecer morbidade operatória. Outro critério a ser seguido será o de se obter os melhores resultados oncológicos com o método, sendo somente realizada a quimioterapia intraperitonial hipertérmica em pacientes em que a citorredução completa tenha sido alcançada. Entende-se por citorredução completa quando todo o tumor macroscópico é retirado com a cirurgia.
Critérios gerais de inclusão de pacientes para a realização de citorredução cirúrgica com quimioterapia intraperitonial hipertérmica (HIPEC):
Assinatura pelo paciente de formulário de consentimento informado.
ECOG performance status de 0 ou 1 (vide definição em anexo I).5
Idade até 80 anos. Pode haver inclusão de pacientes acima desta idade, em casos isolados e muito bem selecionados.
Ausência de doenças associadas incapacitantes.
Ausência de metástases fora da cavidade abdominal.
Ausência de metástases abdominais inelegíveis de ressecção cirúrgica completa.
Realização de citorredução cirúrgica completa, com ausência de tumor macroscópico visível.
Neoplasias peritoneais tratadas com citorredução cirúrgica e HIPEC:
Mesotelioma peritonial
O mesotelioma peritonial tem como tratamento padrão a cirurgia citorredutora com quimioterapia intraperitonial hipertérmica, que é a única forma de tratamento com intenção curativa.2 Pacientes com mesotelioma peritoneal que não são submetidos a citorredução e quimioterapia hipertérmica intraperitoneal tem sobrevida média de 12 anos. Já quando são submetidos à citorredução cirúrgica e HIPEC o tratamento passa a ter intenção curativa com a grande maioria dos pacientes obtendo a cura. O protocolo a ser seguido será a realização de citorredução completa seguida de perfusão com quimioterapia intraperitonial aquecida a 41°C.
Mesotelioma pleural
O mesotelioma pleural está associado à exposição ao arbesto. Seguindo o mesmo princípio do mesotelioma peritoneal, o acometimento da pleura por mesotelioma requer aboradagem torácica para ressecção completa da pleura acometida, associado a perfusão da cavidade pleural com solução de quimioterapia aquecida.
Carcinoma primário do peritônio
O carcinoma primário do peritônio é uma doença rara e o diagnóstico deve ser definido após exclusão da possibilidade de neoplasias primárias do estômago, pâncreas, vias biliares, vesícula biliar, cólons, apêndice, útero ou ovários. Devem ser realizados como exames de diagnóstico: endoscopia digestiva alta, colonoscopia, tomografia ou ressonância daabdome e pelve. Faz-se necessário também a realização de videolaparoscopia diagnóstica para inventário intra-operatório e biópsias para definição do diagnóstico histopatológico.
Pseudomixoma peritoneal
A condição clínica conhecida por pseudomixoma peritonei traduz-se pelo acúmulo intra-abdominal de material gelatinoso composto predominantemente por mucina, produzida por células neoplásicas implantadas no peritônio pélvico e abdominal. Essa doença geralmente tem origem na carcinomatose peritonial proveniente de um adenocarcinoma mucinoso do apêndice cecal ou do ovário, desenvolvendo-se progressivamente e lentamente com formação de grande quantidade de mucina dentro da cavidade abdomino-pélvica causando distensão e dor abdominal além de obstrução do tracto digestivo e/ou urinário.
O tratamento atualmente preconizado do pseudomixoma peritonei é a ressecção do tumor primário com realização de citorredução cirúrgica seguida de quimioterapia intraperitonial hipertérmica e tratamento adjuvante com quimioterapia venosa. Antes do advento da quimioterapia intraperitonial hipertérmica, somente era oferecido a esses pacientes uma citorredução cirúrgica, seguida ou não de quimioterapia venosa, com taxas elevadas de recorrência exigindo re-intervenções cirúrgicas constantes e evolução inexorável para o óbito.9 A sobrevida em cinco anos sem doença apresentou aumento significativo com a utilização da citorredução cirúrgica associada a quimioterapia intraperitonial hipertérmica. Obtém-se uma sobrevida em cinco anos de 37,4%, sem evidência de doença oncológica em atividade, quando é realizado citorredução cirúrgica completa com peritoniectomia e quimioterapia intraperitonial hipertérmica, seguida ou não de quimioterapia venosa em pacientes com pxeudomixoma peritonei.8 Essa taxa cai para 3% de sobrevida em cinco anos sem evidência de doença quando somente é oferecido a citorredução cirúrgica sem quimioterapia intraperitonial hipertérmica.9 A diferença significativa de sobrevida sem doença , de mais de 30% em cinco anos , é uma evidência inquestionável de que a citorredução cirúrgica associada à quimioterapia intraperitoneal é parte essencial da terapêutica do pseudomixoma peritonei.
Adenocarcinoma do ovário com metástases peritoneais
A terapêutica atual do adenocarcinoma de ovário consiste no tratamento cirúrgico com critérios oncológicos do tumor primário seguido de quimioterapia venosa com medicamentos a base de platina. Um obstáculo no tratamento são os pacientes com carcinomatose, já que os quimioterápicos venosos têm pouca penetração na barreira peritônioplasmática.2,3,4 Estes pacientes têm frequentemente doença neoplásica persistente ou recidivante, com poucas opções de quimioterapia de segunda linha, com respostas parciais variando de 14% a 34% mas geralmente evoluindo com progressão da neoplasia e óbito.10 Não existe atualmente esquema efetivo para o tratamento de pacientes com adenocarcinoma do ovário que apresentem persistência ou recidiva após quimioterapia venosa.11
A cirurgia citorredutora associada à quimioterapia intraperitonial hipertérmica vem sendo usada nos pacientes com carcinoma de ovário quando as metástases peritoneais são identificadas logo ao diagnóstico, assim como nos casos em que são identificadas como forma de recidiva da neoplasia.
HIPEC no início do tratamento de pacientes com câncer de ovário com metástases peritoneais obtém taxas de cura muito maiores.12 Trabalho publicado por pesquisadores holandeses, no New England Journal of Medicine, o mais conceituado jornal científico do meio médico, identificou a superioridade da HIPEC no tratamento cirúrgico inicial de pacientes com metástases peritoneais de câncer de ovário.12 O trabalho randomizado, fase 3, mostrou que pacientes com câncer de ovário diagnosticadas já com metástases peritoneais, quando tratadas com quimioterapia sistêmica seguida de HIPEC no momento ressecção cirúrgica do câncer, têm sobrevida em 3 anos 14% maior que as somente submetidas à ressecção cirúrgica do câncer sem HIPEC.12 Esse trabalho indica que a citorredução cirúrgica com HIPEC como primeiro tratamento cirúrgico a ser realizado em pacientes com metástases peritoneais de câncer de ovário é a melhor opção por promover maior sobrevida e cura do câncer, com semelhantes taxas de complicações cirúrgicas, tempo de internamento e qualidade de vida que as pacientes operadas sem HIPEC.12 Resultados como esse indicam, de forma inquestionável, que ressecção cirúrgica com HIPEC deve ser o tratamento inicial de pacientes com metástases peritoneais de câncer de ovário, logo após a quimioterapia pré-operatória (neoadjuvante).
A principal norma a ser utilizada para a realização da cirurgia citorredutora com quimioterapia intraperitonial hipertérmica é a seleção criteriosa dos pacientes que se beneficiarão do método. Só serão candidatos os pacientes em condições clínicas e nutricionais satisfatórias, selecionados após criteriosa avaliação cardiológica sem doenças associadas que poderiam oferecer morbidade operatória. Outro critério a ser seguido será o de se obter os melhores resultados oncológicos com o método, sendo somente realizada a quimioterapia intraperitonial hipertérmica em pacientes em que a citorredução completa tenha sido alcançada. Entende-se por citorredução completa quando todo o tumor macroscópico é retirado com a cirurgia.
Pesquisadores holandeses identificaram a superioridade da HIPEC no tratamento cirúrgico inicial de pacientes com metástases peritoneais de câncer de ovário.
Van Driel WJ et al: New England Journal of Medicine 2018;378(3):230-240
A citorredução cirúrgica com tratamento quimioterápico sistêmico de segunda linha para adenocarcinoma do ovário recorrente ou persistente obtém sobrevida mediana de 22,3 meses com sobrevida em cinco anos de 33,3%.13 Estes resultados quando comparados com os obtidos pela associação da quimioterapia intraperitonial hipertérmica (HIPEC) à citorredução cirúrgica, que foram de sobrevida mediana de 60,9 meses e sobrevida em cinco anos de 53,8%, obtiveram significância estatística (P=0.0015) na demonstração de benefício de sobrevida alcançado pelo método.14
Adenocarcinoma colorretal com metástases para o peritônio
Pacientes com adenocarcinoma colorretal apresentam carcinomatose peritonial em aproximadamente 10% dos casos no momento do diagnóstico.15 Esta porcentagem aumenta para cerca de 35% quando a doença neoplásica apresenta recidiva, sendo como único local de evidência de doença metastática em cerca de 25% dos pacientes.15 Atualmente a cirurgia citorredutora com quimioterapia intraperitonial hipertérmica em pacientes com carcinomatose persistente após tratamento quimioterápico venosos tem mostrado melhor sobrevida do que a citorredução cirúrgica seguida de quimioterapia paliativa em estudos fase II e III.15 Em muitos casos a quimioterapia intraperitonial hipertérmica constitui-se como único tratamento possível quando já se esgotam as alternativas de quimioterapia venosa ou oral.15 Estudos têm mostrado consideráveis taxas de sobrevida em cinco anos em torno de 40% em pacientes com carcinomatose persistente submetidos à citorredução completa e quimioterapia intraperitonial hipertermica.15-17
Sarcomas do abdome com metástases para o peritônio.
Pacientes com sarcomas abdominais com metástases para o peritônio são candidatos a cirurgia de citorredução e podem ser tratados com quimioterapia hipertérmica intraperitoneal (HIPEC).18 Os esquemas de quimioterapia venosa são indicadas somente de forma paliativa, quando os pacientes têm metástases que não são possíveis de ressecção. Nesse contexto, pode ser considerado uma citorredução cirúrgica com HIPEC, desde que toda a doença metastática seja retirada na cirurgia e o paciente não tenha metástases fora da cavidade abdominal.
Os tratamentos de neoplasias peritoneais, que ainda não estão do rol da ANS, permanecem com possibilidade de autorização judicial.
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O que é o peritônio ?
O peritônio é uma fina membrana serosa que reveste as paredes de todo o abdome e pelve, além de revestir todos os órgãos abdominais. O peritônio que reveste o abdome e pelve é chamado de peritônio parietal e o que reveste os órgãos é chamado de peritônio visceral. A...
Referências científicas:
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